terça-feira, 23 de agosto de 2011

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Sítio dos Caídos.

das horas que entram pela cama em que noutra vida
te ensinei o caminho do meu corpo
e da justeza dos gestos com que a alegria
se desenhava em mim quando dizias
agosto tu vais ver é a nossa pátria

nessa altura o verão vinha ainda muito longe
e por isso era possível acreditar em frases dessas
esperando que tudo acontecesse
como nos perdoáveis lugares-comuns dos filmes
que estreiam sempre no natal
e furiosamente desejei que a paixão se enredasse
entre os limos e sargaços das tuas pernas

mas agosto foi apenas um lugar de emboscadas
em todos os precipícios da nossa cama
e lentamente as águas definiram
com rigor implacável
o que sobrava de ti nas minhas mãos
e o silêncio baixou sobre as águas
como antes da invenção do mundo

e agora não sei onde acaba o teu nome
e começa o nome de deus

DOIS CORPOS TOMBANDO NA ÁGUA (Caminho, 2007)


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